Ser fiel a si próprio é um desafio extraordinário num mundo de acordos implícitos, em que toda a gente anuiu em manipular-se subtilmente, sendo que todos o fazem, todos o sentem, todos o reconhecem e ninguém fala nisso. São uma espécie de sub-texto das interacções entre as pessoas. O recriminar subtil e discreto das sobrancelhas que se arqueiam perante o atraso de quarenta minutos do outro, enquanto os lábios são obrigados a repetir mecanica e contrariadamente enquanto os cantos da boca se retorcem "não faz mal nenhum teres-te atrasado" é tão ou mais violento do que uma reprimenda, directa e descarregada. Mas ninguém ousa expressar emoções de vida. Aguenta-se. Carrega-se. Suporta-se. Tolera-se. Aguenta-se. Aguenta-se. E disfarça-se.
Não nos atrevemos a expressar vida ou sentimentos, honrando a Coragem que exige sermos fiéis a nós próprios, porque corremos o risco de assustar os outros, afastá-los, levá-los a abandonarem-nos. Se queremos ser carrascos de nós próprios, acredita a parte mais impotente de nós, votemo-nos à rejeição, ao abandono pelos outros, e quebremos aquele que de todos os mandamentos humanos é a mais perversa de todas as leis: não deverás ser quem és, ou o Pai abandonar-te-á e levará com ele a Mãe. Primeiro perderás a força, estímulo e o entusiasmo, seguidamente o apoio e a matéria definhará para sempre debaixo dos teus sovacos. Vais morrer.
É verdade que em bebês, o abandono é a garantia da morte. Como adultos, no entanto, ser-se abandonado significa somente ser deixado a sós com a sua própria manipulação e a frustração da sua própria impotência. Sozinhos com nós próprios, o resultado final do ciclo anterior e o motor inevitável da próxima fuga para a frente: o paradigma do que é intolerável numa era de transição da manipulação emocional inconsciente para o apelo da Liberdade enquanto mais e mais irmãos de jornada despertam para a realidade da Alma.
E por isso, por esse mesmo medo não nos denunciamos nas nossas manipulaçõezinhas vis e subtis mútuas. Estamos todos ligados... mas enquanto não despertamos para a Alma não é pelos corações que nos unimos; é pelos sentimentos de medo e pelas frequências mentais semelhantes. E todo o desespero frenético de tentar culpabilizar os outros pelos nossos próprios sentimentos, como se nos aliviasse a dor demitirmo-nos da sua autoria ou quiséssemos entregar ao outro a responsabilidade de no-la curar, não é uma solução - é um problema acrescido. Quanto mais acreditamos que o outro nos está a "causar" o que sentimos ou pensamos, mais perdidos estamos do poder pessoal - não aquilo a que uma Humanidade adormecida chama "poder pessoal" como sombras da força física ou inteligência concreta, o património do mecenas, o dinheiro do milionário, o fanatismo da beleza material, a quantidade de diplomas, tatuagens ou lobbies.
Mas o poder pessoal que é a primeira portagem. O que antecede, e sucede, a consciência. O poder de criar. O poder de amar. O poder de servir. Urge ir além das grandes águas, essas que nos mantêm submersos e aquém do nosso próprio poder, do nosso próprio e eterno sol interno.
Mas o poder pessoal que é a primeira portagem. O que antecede, e sucede, a consciência. O poder de criar. O poder de amar. O poder de servir. Urge ir além das grandes águas, essas que nos mantêm submersos e aquém do nosso próprio poder, do nosso próprio e eterno sol interno.
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